O Programa Incluir da UFRGS na minha vida

A pedido da aluna Adriana Dias, que está fazendo uma pesquisan envolvendo acessibilidade na UFRGS, escrevi um relato sobre a minha relação com o Programa Incluir na Universidade. Confesso que demorei um pouco para entregar o texto a ela, pois escrever sobre o Programa Incluir é algo emocionante e desafiador para mim. Depois de enviar o relato a ela, me dei conta que gostaria de compartilhar essa experiência também com os leitores do Três Gotinhas. Então, boa leitura a todos!

As primeiras pessoas que conheci do Programa Incluir da Ufrgs foram a professora Adriana Thoma, o Rafael Giguer e a Liliane Birnfield. Mais adiante conheci a Fabiana Flores Guedes, a Karine Biguelini e, mais recentemente, a Liliane Giordani. Alguns bolsistas foram muito próximos e tiveram papel fundamental como a Bianca Peixoto, a Thayse Benedet, o João Pedro, o João Paulo e tantos outros (que peço desculpas aqui por não citar todos).

Quero salientar o quanto essas pessoas tiveram papel fundamental na minha vida. E não apenas o Programa num nível institucional, mas as pessoas em si, pelo seu caráter humano, pela amizade e pela receptividade e pelo sorriso no rosto que me receberam sempre.

Todos tiveram papel essencial, inclusive no sentido de proporcionar uma maior aeitação da minha própria deficiência. No Programa Incluir nunca me senti um número (como ocorria dentro da maioria das salas de aula). Pude me sentir, sim, a Mariana, com minhas características. Isso é algo único e mágico, pois resgatou a minha identidade.

O Rafael Giguer foi a primeira pessoa que eu conheci com deficiência visual (antes ainda dele trabalhar no Incluir). Ele foi comigo comprar a bengala, me falou sobre como sua vida havia mudado para melhor desde que começou a usá-la e me incentivou muito.

Tive muita resistência em começar a usá-la e a ela ficou guardada no armário de casa por uns dois anos, até eu me sentir apta a buscar um curso de orientação e mobilidade e assumir de vez essa questão, parando de escondê-la dos outros de mim mesma. Hoje fico alegre em ter ajudado meu amigo Felipe Mianes também nesse processo e ter o acompnhado até o mesmo lugar para comprar sua primeira bengala, assim como o Rafael Giguer fez comigo anos atrás.

No Programa Incluir foi a primeira vez em que recebi material adaptado em fontes ampliadas. Foi maravilhoso, pois em toda minha escolarização sempre tive que “me virar”, sem nenhum apoio por parte da escola ou professores. No começo eu achava aquelas adaptações todas em fonte ampliada um “luxo”.

Eu estranhava tantas pessoas empenhadas em adaptar materiais para mim. Aquilo era algo que eu nunca tinha imaginado. Depois, com o tempo e com o maior contato com essas pessoas especiais que me ensinaram tanto, percebi que aquilo não se tratava de um “luxo”, mas sim de um direito. Aos poucos fui mudando minha visão sobre as pessoas com deficiência e sobre mim mesma, aceitando melhor minha condição e aprendendo muito com o convívio com o Incluir. Percebi como minha vida podia ser bem mais tranquila se eu aceitasse ajuda e demandasse material adaptado em todas as aulas e ambientes que fosse necessário.

Hoje tenho orgulho de ser professora, de trabalhar com essas questões de acessibilidade, de lutar por essa causa e de poder ajudar outras pessoas. Tenho isso como um causa maior. Não busco é só para melhorar a acessibilidade para mim, mas para tantas, mas para tantas outras pessoas com deficiência.

O Programa Incluir prima pelo plano ideal de acessibilidade dentro da UFRGS. Infelizmente esse ideal ainda colide com barreiras burocráticas e com a falta de entendimento de muitos servidores, professores e estudantes. Há ainda falta de vontade por parte de muitos e quebrar essa resistência é o maior desafio. A acessibilidade passa por várias esferas, não é apenas uma questão arquitetônica, mas principalmente comportamental.

As dificuldades que tive na Ufrgs, apesar do esforço do Incluir, foram inúmeras. Aulas todas ministradas no quadro negro, sem eu receber o material impresso. Quase sempre eu recebia material em fonte pequena. Não encontrava a sala de aula correta, o prédio, o laboratório (principalmente no campus do Vale, onde o caos é maior). Tinha dificuldade na biblioteca para localizar os livros, para pesquisar no computador, para encontrar banheiro, para ler o cardápio no bar. Os laboratórios, aliás, nunca tinham computador adaptado para mim.

Os laboratórios eram como salas inúteis, que jamais tinham utilidade e não acrescentaram nada em meu aprendizado. Aulas em laboratórios eram as piores, eu sabia que estava lá apenas de corpo presente para responder à chamada, pois não conseguia acompanhar. E ficava assim mesmo, acho que os professores não percebiam e/ou não estavam muito preocupados.

Lembro da disciplina de Latim, dentro do curso de Letras, que eu comecei e tranquei umas três vezes. Jamais consegui conclui-la porque a professora dava toda aula no quadro, tinha que usar dicionário com a letra minúscula, era terrível. Latim já é difícil para qualquer aluno, para mim então era pior. Não porque eu não tivesse capacidade, mas porque eu não tinha acesso adequado às aulas.

Foi durante o mestrado que mais utilizei o Programa Incluir, entre 2010 e 2012. Mas antes eu já cursava algumas disciplinas da Letras, desde 2005. Durante o mestrado a quantidade de leitura era imensa. Muitos livros por semana, mais centenas de revistas para mapear para minha dissertação. Foi um período muito exaustivo em termos de carga de leitura. O Incluir nem sempre conseguia adaptar tudo em tempo, mas eles faziam o melhor possível. Ainda faltam funcionários e o número de bolsistas nem sempre é suficiente.

O Incluir me ajudou imensamente no mestrado, do início ao fim. Na seleção já recebi a prova ampliada, o que era essencial para que eu conseguisse realizá-la em plenas condições. Todos os bolsistas e funcionários estão nos agradecimentos da minha dissertação. Fico muito orgulhosa por ver toda essa trajetória, de crescimento acadêmico e principalmente pessoal. Gostaria de salientar o quanto o Incluir teve esse papel importante na minha própria aceitação da deficiência.

Aprendi a pensar mais sobre a minha deficiência e, ao mesmo tempo, a pensar menos sobre isso nos momentos em que não importa tanto. Afinal, o ser humano é vai muito além de suas limitações físicas. Agradeço ao Incluir por me apontar esse caminho e por seguir dando superte na trajetória de vida de tantas pessoas. Quero deixar um abraço especial aos amigos que conquistei e conheci através do Programa, em especial ao Felipe Mianes e à Ariane Bernardes.

5 opiniões sobre “O Programa Incluir da UFRGS na minha vida”

  1. Bruna! Eu é que me considero uma pessoa de sorte por ter te conhecido. Foi ótimo ter assistido uma aula tua. E mais do que isso: quero ir naquele bar que vc deu a dica hein? Vamos marcar uma ceva la??? beijo MariMari

  2. Mas ah, também me candidato para essa rodinha de discussão no bar 😉 hehehe…

    Gostei muito do texto Mari! Acho que é inspirador para as demais pessoas refletirem sempre sobre os desafios e também sobre as possibilidades que a vida oferece.
    E também adorei demais ter te conhecido.

    Essa é uma das coisas que o Programa Incluir faz pela gente, que vai muito além de folhas de papel com letras grandes (e, por sinal, como são úteis os materiais ampliados). Mas o valor de uma amizade como a nosso é algo inestimável. Te adoro amiga!
    Abração!
    Ari.

  3. Bruna, Guilherme, Ari!!!!!!!!!! Vamos sim marcar essa ceva. Por mim pode ser sim semana q vem. Q tal terça, 23???? no bar DA BRUNA, EHEHEHEHEHE.. Por mim terça dia 23, tipo 20h?? ta valendo??? beijo

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