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PELA LIBERDADE DE DAR UMA VOLTA NA QUADRA

Uma das coisas que mais me incomoda em Porto Alegre é o precário estado de conservação das calçadas. São buracos, lajotas quebradas, desníveis e todo tipo de obstáculo no caminho. Se não bastassem os fradinhos (aqueles postes baixinhos, mais conhecidos como “capa-cegos”), é preciso também desviar de placas, orelhões, propagandas comerciais, lixeiras, postes, entulhos e até carros estacionados nas calçadas!

Na avenida Vicente da Fontoura, onde circulo todos os dias, em frente ao Colégio Santa Cecília, por exemplo, tenho evitado caminhar no horário das 18 horas. Isso porque é o horário de saída das crianças da escola. Os pais não tem onde estacionar na rua para buscar os filhos. Então eles adotaram a “brilhante” solução de subir todos na calçada e ficar interrompendo a passagem dos pedestres. Semana passada desviei de uns cinco carros que formavam um verdadeira labirinto para ser percorrido com a bengala. Ninguém veio me ajudar. Quando estava feliz (pensando que tinha me livrado daquele emaranhado de armadilhas) fui desviar do último carro e acabei batendo na grade de ferro da escola. Não me machuquei gravemente, mas poderia ter ficado com o rosto marcado ou até me cortado.

Foi uma situação constrangedora. Fiquei com muita raiva, não apenas pela dor física, mas pelo sentimento de ser constantemente submetida a esse tipo de situações. É como se fosse uma prova de resistência emocional a qual sou submetida todos os dias.

Não é apenas em frente àquela escola o problema de falta de acessibilidade em Porto Alegre. Na verdade, eu sinto falta de poder sair de casa em um dia qualquer, em um horário qualquer (sem ter de cuidar se é horário de saída das escolas), e poder dar apenas UMA VOLTA NA QUADRA DE FORMA DESPREOCUPADA. Quando cheguei na academia (local onde estava indo aquele dia quando bati na grade do Colégio) desabafei com minha professora e ela concordou comigo dizendo que eu nunca poderia sair na rua distraidamente.

Fiquei pensando sobre isso… Eu NUNCA vou poder sair na rua descontraidamente para dar uma volta na quadra, pensando na vida, cantando uma música, caminhando livremente pelas calçadas? Sempre terei o risco de cair em um buraco, de me surpeender com um obstáculo, obra, carro ou placa no caminho… Apesar de eu conviver diariamente com essa situação, senti um aperto no coração, pois me dei conta de que ao longo dos meus 28 anos jamais caminhei livremente em nenhuma calçada da minha cidade.

Lembrei daqueles dias em que o sol está agradável e as pessoas saem para caminhar na rua, principalmente agora que está chegando a primavera. Não, nem nesses dias eu posso sair tranquila para caminhar de forma relaxada. Sair na rua para mim – e para tantas outras pessoas com deficiência – significa tensão e necessidade de atenção constante.

Em época de eleições, em meio a tantas propostas inconsistentes, me pergunto… Tem algum candidato preocupado em fiscalizar a conservação das calçadas de Porto Alegre e do país? Tem algum candidato comprometido em solucionar esse e tantos outros problemas que realmente fazem diferença na vida das pessoas? Espero que um dia todas as pessoas possam circular pelas calçadas despreocupadas e tranquilas. Não apenas por terem acessibilidade nas calçadas, mas por temos emprego, saúde, educação, desenvolvimento sustentável e qualidade de vida.

Sobre calçadas e mentes deterioradas

Degraus e obstáculos inacessíveis, pedras no caminho, sacos de lixo e entulhos nas calçadas, obras mal sinalizadas estão por toda parte. Quando uma pessoa com deficiência visual sai de casa, trabalha, estuda, vai a uma festa, enfim, vive a vida, o primeiro desafio é locomover-se pelas calçadas de Porto Alegre.

As calçadas são a base para o deslocamento de qualquer pessoa. É por elas que nos locomovemos, teoricamente em segurança – o que infelizmente não acontece devido ao seu precário estado de conservação.

Quando digo que as calçadas não vão bem, quero dizer que a base da sociedade não vai nada bem. Não falo apenas nas calçadas propriamente ditas. Falo em barreiras atitudinais. Algo que vai além de obstáculos físicos: a consciência, o respeito e o bom senso.

Se há um carro estacionado no espaço dos pedestres é porque alguém o colocou ali. Parece óbvio dizer isso, mas os objetos e bens materiais não têm vontade e autonomia própria. Se um prédio não tem rampa de acesso é porque seus arquitetos e engenheiros o conceberam assim. Afinal, para que rampas se eles não iriam utilizá-las?

Por trás das calçadas deterioradas, dos prédios, dos elevadores, dos ônibus, dos espaços públicos inacessíveis existem pessoas que os projetaram.

Mais difícil do que lidar com as barreiras arquitetônicas, é lidar com os indivíduos que as conceberam. Mais difícil do que cair um tombo, esfolar o joelho, ralar a mão e torcer o pé, é lidar com as pessoas que estavam lá o tempo todo e não consertaram aquele buraco, deixando com que você caísse e se machucasse.

É triste dizer isso, mas as barreiras físicas são as menos graves com as quais nos deparamos diariamente. Muito mais difícil é lidar com o despreparo e o desconhecimento das pessoas para lidar com qualquer diversidade.

Muitas vezes somos subestimados em nossas capacidades pessoais, profissionais e intelectuais simplesmente por termos uma deficiência física. Não me considero mais ou menos capaz que outros colegas jornalistas somente pelo fato de ter baixa visão. A capacidade, o profissionalismo, o caráter e o desempenho de uma pessoa estão aquém do fato dela ter ou não qualquer deficiência.

Infelizmente isso ainda é algo distante da compreensão das empresas, dos órgãos públicos e da sociedade em geral. O que eu e tantas outras pessoas com deficiência defendemos é simplesmente oportunidades iguais, com as devidas condições de trabalho que necessitamos. Precisamos de oportunidades e espaço para mostrar aquilo que somos capazes de fazer.

Citando frase da publicitária Juliana Carvalho, precisamos “construir rampas na cabeça das pessoas”. Cair e levantar de tombos em calçadas em péssimas condições, espalhadas por toda parte? Nada é tão difícil quanto conviver com o preconceito, a subestimação e os estereótipos alimentados por esses mesmos indivíduos que não consertam suas calçadas, tão pouco reciclam sua mentalidade deteriorada.

São esses os indivíduos – que não arrumam suas calçadas – que no dia a dia não irão enxergar minhas capacidades e potencialidades além da deficiência. É nesse momento que me pergunto: quem tem baixa visão nessa história?

Mais do que consertar calçadas, é preciso reciclar as ideias e a mentalidade humana.

Obstáculos urbanos

A quantidade de obstáculos e espaços inacessíveis que dificultam a locomoção pelas ruas é imensa. Essa semana resolvi sair de casa com a máquina fotográfica para registrar alguns exemplos.
Em uma caminhada de cerca de 15 minutos próximo à minha casa em Porto Alegre já foi possível encontrar inúmeras situações. São obstáculos e barreiras que dificultam ou impedem a livre circulação de pessoas cegas, com baixa visão, com mobilidade reduzida ou cadeirantes.

Na primeira foto, a imagem horizontal de uma calçada com uma das lajes levantada. Duas pedras estão faltando, formando um buraco no piso. À esquerda, a rua asfaltada. À direita uma grade de ferro branca.

A segunda foto, tirada na vertical, mostra um poste de madeira localizado no canto de uma calçada. A uma distância de cerca de três metros dele, um fio de aço na vertical, em paralelo ao poste.

Fios de aço como esse se constituem de uma verdadeira armadilha para deficientes visuais. Já que são muito finos, geralmente a bengala não consegue os identificar. Esse está na vertical, mas em muitos casos esses fios de aço são colocados na diagonal em relação à calçada, representando um perigo maior ainda. A pessoa que não enxerga pode bater as pernas, a barriga ou até a cabeça. No meu caso, que tenho baixa visão, consegui ver o poste de madeira (que é bem grosso), mas o fio de aço é praticamente impossível, pois ele é muito sutil e desaparece na paisagem urbana, já tão poluída por diversos elementos.

Na terceira foto, a imagem horizontal de uma calçada com galhos de árvore e um monte de terra obstruindo parte da passagem. À esquerda, a rua asfaltada. À direita, um muro de pedra, onde os galhos e a terra estão em parte encostados.

A quarta foto, tirada na vertical, mostra um orelhão do lado direito de uma calçada. À esquerda da calçada, uma casa e à direita, a rua.

Os orelhões representam um risco para deficientes visuais por constituírem-se de um obstáculo aéreo, o que impede sua identificação através da bengala. Seria necessário que todos os orelhões tivessem algum tipo de marcação no solo para que a pessoa com deficiência visual pudesse desviar deles sem o risco bater a cabeça.

A quinta imagem, na horizontal, mostra uma calçada com galhos de uma palmeira caídos à direita e o poste que sustenta uma placa à esquerda. Ao fundo está a rua asfaltada e prédios.

PARTICIPE VOCÊ TAMBÉM!!!
Esses foram apenas alguns exemplos de barreiras encontradas corriqueiramente nas ruas da cidade. Se você também transita por espaços inacessíveis, tire uma foto e encaminhe para o TRÊS GOTINHAS com o seu depoimento. Será um prazer publicar a sua foto! Mande também seu nome completo, cidade onde foi tirada a foto e a descrição da imagem. Aguardo sua participação!
Email: tresgotinhas@gmail.com

Vídeo inclusivo

“De Boca em Boca: um filme para todo mundo”, curta-metragem produzido pela ONG Vez da Voz. Possui áudio, legenda, tradução em Libras (Língua Brasileira de Sinais) e audiodescrição.

Além de trazer linguagens e comunicação acessível, o filme mostra situações cotidianas na vida de pessoas com deficiência.

Tocar a campainha de um prédio com interfone pode ser simples para muita gente. E se a pessoa for surda?

O trânsito em calçadas esburacadas por cadeirantes ou deficientes visuais também não é fácil. A ausência de rebaixamentos, obstáculos no caminho como sacos de lixo, pedras, galhos de árvores, orelhões, fios caídos e até carros estacionados na calçada atrapalham ou até inviabilizam a passagem.

Mas vale lembrar que não são apenas barreiras físicas e de estrutura arquitetônica que dificultam a vida da pessoa com deficiência.

Eu diria que, muitas vezes, a educação e a disponibilidade dos outros em ajudar é tão ou mais importante do que propriamente os ambientes adaptados.

O vídeo mostra ainda que não sair de perto de uma pessoa com deficiência visual sem avisá-la ou não sentar-se à mesa sem comunicá-la são pequenas atitudes que dependem apenas do bom senso das pessoas que a cercam. Simples comportamentos dos demais contribuem muito para a melhor orientação e relacionamento interpessoal do deficiente visual.

Ir ao dentista é outra atividade que pode não ser tão fácil assim quando a pessoa não enxerga ou não escuta. Nesse sentido, um dentista que saiba Libras é essencial para viabilizar a comunicação sobre questões de saúde (de extrema importância) e atender com qualidade e respeito o paciente.

O mesmo vale para outras situações de prestação de serviços, como, por exemplo, ir ao salão de beleza, restaurante, cinema, teatro, loja, supermercado, transporte.

Profissionais preparados para atender com qualidade e respeito devem existir em todas as áreas.

Vale a pena conferir o vídeo!!!

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