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´Baixa visão e cegueira

A leitora Carlise Kronbauer enviou ao Três Gotinhas um depoimento bem interessante sobre sua experiência com baixa visão e depois coma cegueira. O relato é bem eloquente e evidenciai a dificuldade de compreensão e o desconhhecimento dos professores com relação à baixa visão.

Carlise é natural de Santa Rosa/ RS, mas foi morar em Giruá aos três anos de idade, onde cursou todo o Ensino Fundamental e Médio. É graduada em História pela Unijuí. Vale a pena conferir o texto dela! E se você também tiver algum depoismento, escreva para mim. Terei o maior prazer em compartilhá-lo!

“Nasci com baixa visão e fiquei cega aos 16 anos. Quando era estudante da Educação Básica tinha baixa visão. Vivenciei constrangimentos causados por práticas pedagogicamente incorretas, como, por exemplo, ser orientada a localizar informações em mapas expostos no mural da sala de aula. Essa situação veio acompanhada pela repreensão da professora por eu não atender à sua expectativa, além de chacotas de colegas insensíveis à minha deficiência.

Acredito que ter baixa visão é mais complicado que ser cego, pois muitas vezes não conseguia ler as provas que, mesmo solicitando letra ampliada, eram minúsculas. Os professores raramente lembravam da minha solicitação, trazendo frustração no momento da realização. Depois de ter ficado cega comecei a realizar as provas oralmente.

Devido a baixa visão não conseguia realizar os trabalhos de Educação Artística como os outros. Nenhuma alternativa era apresentada, bem como nas aulas de Matemática e Educação Física. Depois da perda da visão, não praticava quase nada nas aulas de Educação Artística e não realizava Educação Física.

Nas aulas de Matemática meu irmão adaptava os gráficos com lã e grãos de feijão, conseguindo fazer eu aprender também Física e Química. O que deveria ser proporcionado pelos professores era negligenciado, sendo suprido por meu irmão.

Com a baixa visão não realizava muita leitura de livros, devido a letra dos mesmos ser pequena. Já com a perda da visão minha família realizava a leitura de livros e materiais, pois a escola não possuía livros em braille e somente tive acesso a computador adaptado em casa em 2007. Dessa forma, realizei todo Ensino Médio e Superior com a utilização do braille.

Havia ainda as ocasiões em que, já com a perda total da visão, os professores, sem aviso prévio, apresentavam materiais em vídeo legendado, sem a devida tradução oral dos mesmos. Na época sentia-me entristecida, mas, por não saber me defender e propor alternativas ou exigir meus direitos, mantinha-me passiva.

Em 2001 meus pais mobilizaram os pais de outros cegos e foram a luta para a criação da sala de recursos para atender as necessidades dos cegos em Giruá onde morava, pois para aprender a escrita braille tive que me deslocar a Ijuí. Conseguimos criar em Giruá também a Associação dos Deficientes Visuais.

Atualmente, Giruá possui o centro de reabilitação de baixa visão e cegueira, com profissionais qualificados para ensinar braille, orientação e mobilidade, técnicas da vida diária e estimulação precóce, oferecendo atendimento a todos os cegos da região.

Durante a graduação consegui que fosse criada na Unijuí a sala de apoio aos deficientes visuais a qual oferecia auxílio através de monitoras que faziam a leitura de livros e materiais, pois a universidade não possuía computador adaptado, nem livros em braile.

Enfim, depois que perdi a visão me senti melhor estudando, pois não havia mais dúvida de minha deficiência. Com a baixa visão era um sofrimento: os professores não entendiam meu problema e as necessidades que tinha. Devido minha falta de experiência sofria calada com os abusos dos educadores. Posteriormente, com a cegueira, aprendi que precisamos correr atrás de nossos direitos e mostrar que temos capacidade para atingir nossos objetivos apenas utilizando materiais específicos a nossa deficiência.”

(Carlise Kronbauer)