O surf para todos

A ONG AdaptSurf, com sede no Rio de Janeiro, promove a inclusão social através do esporte desde 2007. São realizados cursos de surf para pessoas surdas, cadeirantes, cegas, com baixa vis~]ao, com síndrome de down, paralisia cerebral, mobilidade reduzida etc.

Regularmente ocorrem aulas de surf todos os finais de semana no Rio de Janeiro, na praia do Leblon e na Barra da Tijuca. Mas a ONG já realizou encontros e atividades no Brasil todo, inclusive aqui no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina.

Segundo Luiz Phelipe Nobre, fisioterapeuta e sócio-fundador da ONG, os cursos de surf são compostos por aulas teóricas e práticas. Quanto à prática do esporte, ocorrem as adaptações necessárias para cada aluno, seja no tamanho da prancha, seja na metodologia da aula.

Os cadeirantes e pessoas com mobilidade reduzida deitam na prancha, outros ficam ajoelhados. Os deficientes visuais treinam o equilibrio e e orientação no mar, contando com orientações sonoras através de apitos.

A AdaptSurf não realiza apenas cursos práticos de surf. Há um trabalho para que a praia seja acessível, com rampas de acesso, caminhos livres, sinalização adequada. Afinal, ressalta Luiz Phelipe, “não basta oferecer surf adaptado se a praia nao for acessível”.

Esta é também uma maneira de mostrarmos para a população em geral que a praia é um lugar para todos. E que todos têm o direito de fazer esportes, estar em contato com a natureza e se divertir no verão praticando esportes à beira da praia.

Eu conversei também com Paulo Ricardo Souza, que é um surfista gaúcho praticante de kneeboard, uma modalidade de esporte que beneficia pessoas com mobilidade reduzida, como é o caso dele. A pessoa nao fica de pé na prancha, mas apoiada de joelhos. Ele conta que o surf mudou sua vida, melhorando o astral, o equilíbrio físico e emocional. Paulo é surfista há treze anos e já participou de campeonatos de surf no Rio de Kaneiro, inclusive promovidos pela AdaptSurf./

Aqui no RS ele é presidente da União de Surfistas e Skatistas do Município de Xangrí-la. Essa entidade trabalha com o esporte em geral, não necessariamente para pessoas com deficiência. Um dos objetivos da entidade para 2013 é trazer o surf adaptado para o litoral gaúcho. Uma iniciativa de extrema importância, visto que ainda não temos ninguém trabalhando com essa modalidade esportiva no RS.

Eu, com certeza, vou ficar torcendo para que isso ocorra e para que a prática esportiva seja cada vez mais difundida – não apenas no surf, mas em todas as áreas, não apenas para pessoas com deficiência, mas para toda a população, pois os benefícios são enormes.

Abaixo vídeo com o depoimento de Paulo Ricardo sobre a prática so surd em sua vida:

LINKS:
Adaptsurf
http://www.adaptsurf.org.br

União dos surfistas e skatistas do município de Xangri-la
http://ussmx.blogspot.com.br/

Entrevista – projeto Praia Acessível

O programa Cidadania da TVE foi apresentado nessa sexta-feira ao vivo de Capão da Canoa/RS. Nessa oportunidade eu conversei com a diretora administrativa da FADERS Janete Jachetti sobre o projeto Praia Acessível, que disponibiliza cadeiras de roda anfíbias para o banho de mar por pessoas cadeirantes ou com monilidade reduzida. Confira:

Acessibilidade na praia

Desde criança sempre gostei muito de ir à praia. A sensação de estar na areia, sentir a brisa, entrar na água, relaxar é muito boa. Mas para quem tem baixa visão, como é o meu caso, ou qualquer outro tipo de deficiência, a praia reserva algumas armadilhas.

Sempre senti dificuldade ára ir até a beira da praia sozinha, pois geralmente não há um caminho livre e desobstruído. Às vezes temos que fazer trilhas no meio das dunas para chegar à ´praia. Ou temos que passar por desníveis e caminhos irregulares, em que encontramos cacos de vidro, lixo, galhos de árvore, calçadas quebradas. Várias vezes já cai e torci o pé nesses percursos.

Em alguns casos, há escadas e degraus sem nenhuma sinalização. São degraus na cor cinza, a mesma cor da calçada, que levam até a areia. Uma simples listra branca poderia ajudar muito na visualização de quem tem baixa visão. Ou ainda, o piso tátil pode fazer a diferença para pessoas cegas e com baixa visão, pois pode ser identificado com a bengala.

Quem tem deficiência visual acaba criando alguns “artifícios” para se locomover com mais autonomia e segurança. Eu sempre costumo fazer o mesmo caminho por onde ando. Na praia não é diferente: faço o mesmo trajeto para chegar até a areia. Assim me acostumo a driblar os obstáculos, que se tornam conhecidos.

Somos surpreendidos, porém, quando surge uma obra ou obstáculo repentino. E muitoas pessoas nao se dão conta que deixar um obstáculo no caminho pode levar a um acidente.

Quando eu era criança lembro de cometer algumas “gafes”. Ia brincar na água e depois não conseguia voltar para o guarda-sol certo onde estava minha família. Olhando à distância, os guarda-sóis são todos iguais. Algumas vezes chegava a me dirigir ao grupo de pessoas errado. Ficava com muita vergonha.

Quem tem baixa visão, só consegue reconhecer as pessoas a uma distância de um ou dois metros de distância. Minha estratégia, nesse caso, era caminhar rente à linha de guarda-sóis e esperar que alguém me chamasse, sem que eu precisasse me dirigir até alguém sem ter certeza de quem era.

Já na adolescência, minhas amigas queriam ficar na areia olhar os surfistas na praia. Sempre as acompanhava, mas digamos que nessa parte eu ficava um pouco “prejudicada”. Acabava esperando pelo momento certo em que eles tivessem entrando ou saindo do mar. Nesse momento eu tentava chegar o mais próximo possível para conseguir vê-los. As amigas acabavam fazendo então, mesmo sem saber, uma audiodescrição improvisada dos surfistas.

Atualmente essas dificuldades continuam, mas acho que fui aprendendo a conviver melhor com elas. Ainda sinto dificuldade em relação aos prestadores de serviços. As lojas no litoral, os restaurantes, o comércio, os hoteis e pousadas não estão bem preparados para atender a pessoa com deficiência com qualidade. Falta infraestrutura física e capacitação dos atendentes.

Como não gosto de simplesmente fazer críticas (sem apontar nenhuma solução) trago aqui algumas sugestões que podem fazer a diferença nos estabelecimentos comerciais. A disponibilização de um cardápio em fontes ampliadas e em braille pode ser fator decisivo para conquistar um cliente com deficiência visual ou idoso (com algum comprometimento visual mais acentuado). Nesse sentido, a boa iluminação do ambiente também é importante.

Manter o caminho livre entre as mesas, de modo que a pessoa cadeirante, com mobilidade reduzida, que esteja empurrando um carrinho de bebê, com deficiência visual ou idosa possa circular sem encontrar barreiras. Outra medida simples (que pode auxiliar e muito) é colocar caixas e balcões na altura de uma pessoa sentada. Assim, o cadeirante ou pessoa de baixa estatura não fica impossibilitado de chegar ao caixa, efetuar o pagamento ou escolher um produto com autonomia.

Não existem fórmulas mágicas de como tornar um local acessível. Pensar no público consumidor e nas diferenças entre as pessoas no momento de planejar um espaço, de fazer uma obra ou reforma deveria ser óbvio e banal – mas ainda não é. Creio, porém, que se a regra do bom senso e do respeito ao próximo for seguida estaremos no caminho certo.

Os pequenos grandes momentos de 2012

Alguns pequenos, mas grandes momentos merecem ser relembrados no ano de 2012. E gostaria de dividi-los com os amigos e leitores do Blog Três Gotinhas. Não vou falar aqui sobre grandes conquistas, que também ocorreram (como concluir o mestrado, começar num novo trabalho etc), mas sobre os simples acontecimentos do dia a dia. Coisas que poderiam passar despercebidas, mas que faço questão de registrar e valorizar, Coisas que, para mim, não passaram em vão.

Em 2012, além de ter a alegria de ser chamada de professora pela primeira vez (profissão que eu admiro imensamente desde criança), tive a satisfação de receber dos meus alunos O PRIMEIRO CARTÃO EM FONTES AMPLIADAS DA MINHA VIDA.

Ao término do curso de extensão “Educação, Cultura e Acessibilidade” (na Faculdade de Educação da UFRGS) os alunos presentearam eu e o Felipe Mianes (que coordenou o curso comigo) com chocolates e um cartão gigante para cada um. O cartão, em fontes grandes, foi assinado com canetinha hidrocor preta por toda a turma.

Pode parecer algo singelo, mas para mim não foi. Ninguém nunca tinha tido essa ideia de me entregar um cartão tão lindo e personalizado. Sei que foi feito realmente para mim, pois tinha fontes grandes e eu pude ler sem lupa, sem ter que fazer um grande esforço. É maravilhoso me sentir respeitada em minhas individualidades. Às vezes estou tão acostumada a “me adaptar ao mundo” que fico impressionada quando ocorre o contrário (e as minhas necessidades são respeitadas).

Por isso, esse é um cartão cheio de significado para mim. É o símbolo de uma conquista de um mundo com um pouco mais de respeito.. Um cartão que será guardado com carinho por toda a minha vida. Além de uma demonstração de afeto, os alunos mostraram que, mais do que discutir acessibilidade, eles já sabem colocá-la em prática.

Ao digitar essas palavras, com os olhos marejados, lembro como fiquei triste com o último dia de aula. Eu, que sempre fui ansiosa e quis que as coisas terminassem rápido devido à minha falta de paciência, tive o gosto amargo de ter de dizer tchau antes da hora desejada. Eu queria que o curso durasse mais alguns semestres. A riqueza de valores das pessoas, a troca de experiências e o talento de cada um foram gratificantes.

Fico feliz ao ler, após o término das aulas, as palavras calorosas e a demonstração de saudades dos alunos no Facebook e também no blog da Vanessa Dagostim – aluna que organizou a entrega dos cartões. Vale a pena conferir: http://www.vendovozes.com/2012/12/curso-educacao-cultura-e-acessibilidade.html

Ler essas palavras me dá a certeza de que é nessa linha que quero continuar seguindo. Que eu ainda tenho muito a aprender com novas e novas turmas que virão. Uma etapa que foi concluída com o fim do curso, mas que está só começando para além da sala de aula e se estenderá para a vida de cada um. Sei que a turma continuará multiplicando seu conhecimento e respeito à acessibilidade em outros espaço e situações. E isso me deixa feliz e orgulhosa pelo trabalho que realizamos.

Outro fato marcante em 2012 foi o dia em que um garçom de um bar que eu estava com uns amigos me reconheceu em função de uma reportagem que fizeram comigo na TV Assembleia (no programa Faça a Diferença, sobre meu trabalho na TVE). Ele disse que, em função da matéria, não deixava mais nenhuma cadeira no caminho. Passou a se preocupar com as pessoas com deficiência visual, que poderiam cair, se machucar com os obstáculos no caminho ou com as pessoas com dificuldade de locomoção, que também seriam prejudicadas.

Nessa reportagem (http://tresgotinhas.com.br/materia-no-programa-faca-a-diferenca/), minha colega Amanda Carvalho (produtora do Cidadania) falou que, em função de mim, ela passou a se preocupar em tirar as cadeiras da Redação da TVE que ficam no meio do caminho (para que eu não tropeçasse ou esbarrasse nelas). Fiquei imensamente feliz ao perceber que o depoimento da Amanda estava, de alguma forma, gerando uma mudança no comportamento de outra pessoa.

O fato de ter um funcionário preocupado com cadeiras no caminho naquele bar já estava fazendo a diferença na minha vida e na vida de outras pessoas que frequentassem o local. Uma pequena mudança, algo aparentemente banal, mas muito difícil de ser colocado em prática.

Quanto às cadeiras na Redação da TVE, talvez ninguém entenda porque eu esbarro tanto nelas e, ao mesmo tempo, consiga desviar de outros obstáculos aparentemente mais difíceis de serem notados. Mas essas cadeiras são pretas, colocadas sobre um piso preto. Ou seja, não há contraste nenhum com o chão. Elas não se destacam e acabam tornando-se invisíveis para mim. Para quem tem baixa visão essa questão do contraste é importantíssima.

Nesse ano de 2012 tive que conviver e caminhar todos os dias por entre essas cadeiras, desviar de obstáculos o tempo todo. Não podia simplesmente ficar braba e jogá-los no chão ou colocá-los onde eu quisesse, pois sabia que depois as pessoas os colocariam no caminho novamente. Nem tudo é fácil. Os obstáculos estão por toda a parte e todos precisam conviver com eles.

Embora eu defenda a acessibilidade em todos os ambientes, sei que o mundo está longe de ser um local ideal de se viver para qualquer pessoa, independentemente de ter ou não alguma deficiência. Então gostaria de terminar essa “retrospectiva” com um pensamento que remete ao título do Blog. Já que não podemos mudar o mundo todo de uma vez, quem sabe de gotinha em gotinha a gente consiga transformá-lo em um ambiente melhor, com mais amor, paz, respeito e sensibilidade!

E de gotinha em gotinha, o meu esforço está fazendo sentido, não só para mim, mas também na vida de outras pessoas. É por isso que eu agradeço a leitura, os comentários e o apoio de todos que compartilharam momentos bons e ruins comigo no ano de 2012, lendo e contribuído com esse blog. Que em 2013 surjam muitas e muitas histórias felizes para serem narradas aqui.

Um grande abraço com carinho, Mariana Baierle

Por Mariana Soares