De cor em cor

De cor em cor

A cada cor

o mundo nasce

 

Mundo sem cor

Acolor

Mundo com cor

Multicolor

 

Esmalte com cor

Sem cor incolor

Com muita cor

Não sei que cor

 

Brinco prata

ou dourado?

Brinco dourateado

Combinando com o sapato?

 

Para dançar

precisa de cor?

Precisa combinar

Mesmo no escuro?

 

Transcender

Trans  – cen – der

Trans – sem – ver    

 

Ver sem ver

Olhar e ver

Ver sem olhar

 

Olhar e enxergar

o mundo cinza

 

Colorar o olhar

Transolhar sensível

 

Olhar e enxergar

as cores do mundo

mesmo escuro, cinza e frio

Obra mal sinalizada causa acidente

A leitora e minha amiga Tatiane Soares Jesus me escreveu essa semana relatando um episódio lastimável e pediu que eu o compartilhasse no blog. Vamos ao fato, nas palavras dela:

 

“Eu estava essa terça-feira (29/11) saindo do supermercado com a minha afilhada, às 21h. Voltando pra casa, passei por uma loja (Secreta Vaidade, na avenida Protásio Alves, 278, bairro Rio Branco) que estava em obras.

Havia na calçada vários obstáculos no caminho e alguns cavaletes de ferro que batem na altura da barriga.

Na nossa frente caminhava um casal. Eu vinha mais atrás e só enxerguei a bengalinha da moça, mas como ela estava acompanhada continuei a conversar com minha afilhada.

Só que os dois tinham baixa visão. Quando escutei um “ai. ai” eles já tinham batido de barriga nos cavaletes. Bateram, mas não chegou a espetar nenhuma ponta neles graças a Deus.

Eles começaram a reclamar. Então chegaram dois funcionários da obra e ficaram parados sem falar com eles, como se já estivessem ali cuidando pra ninguém cair e eles é que não viram…

Logo depois que o casal foi andando apareceu uma mulher na porta, que parecia a dona, e eu falei: “Eles se machucaram, tem que ter alguma sinalização aqui”. E ela só ficou me olhando e não me respondeu nada.

Na hora só pensei em ajudar o casal a chegar até a parada de ônibus que eles queriam. Mas toda essa situação me deu muita raiva!”

 

Episódios como esse relatado pela Tatiane, infelizmente, são muito comuns, Cavaletes podem ser ótimos sinalizadores para as pessoas que enxergam com perfeição. Mas para os deficientes visuais representam uma armadilha.

 

Nos cavaletes há uma estrutura de madeira (ou outro material) suspensa e, por isso, não identificável pela bengala, que toca somente o chão. A pessoa só percebe sua presença quando já bateu o próprio corpo no objeto – o que pode ocasionar acidentes graves.  

 

No caso de placas, fios de aço (atravessados nas calçadas), orelhões, galhos de árvores, entre outros, a bengala também não os capta. Por isso representam um grande risco à segurança de pessoas com deficiência visual.

 

Mais do que isso, tais obstáculos desrespeitam os direitos humanos. Qualquer pessoa tem o direito de ir e vir e de transitar com liberdade, segurança e autonomia por calçadas e ruas da cidade.

 

Para uma devida sinalização é preciso que qualquer obra, principalmente em calçadas, seja devidamente identificada com piso tátil ou marcações na altura do chão que permitam ao deficiente visual desviar corretamente.

Profissionalismo sim, caridade não

Ao comentar com uma pessoa conhecida sobre o curso de audiodescrição em ambientes culturais que estou fazendo na UFRGS, fui interpelada com o questionamento se a atividade tinha algum convênio ou relação com uma instituição social.

 

Respondi que não e perguntei: “Por quê? Deveria ter algum convênio?”. E a pessoa respondeu: “É que geralmente essas coisas têm um cunho social e são ligadas a alguma ação filantrópica”.

 

Melhor nem perguntar o que a pessoa quis dizer com “essas coisas” para não me incomodar, pensei. Mas essa situação não saiu da minha cabeça desde então.

 

Fiquei pensando o quanto qualquer ação em prol da acessibilidade ainda está ligada no imaginário das pessoas a uma obra social e até a caridade.

 

Acessibilidade ainda não é encarada como uma obrigação, um dever e uma responsabilidade de todos.

 

O que mais me chama atenção no curso, no qual tenho o privilégio de ser aluna da Letícia Schwartz, é o profissionalismo e a seriedade com que a audiodescrição vem sendo apresentada. A ministrante, em nenhum momento, se coloca em uma postura de benevolência, comiseração ou compaixão com os deficientes visuais.

 

Aliás, muito pelo contrário. O tema é tratado com o respeito e a seriedade merecidos.

 

Nesse curso, o deficiente visual não é entendido como alguém sem capacidade intelectual ou posicionamento crítico – como infelizmente ainda acontece nos dias de hoje.

 

O deficiente visual é ouvido e consultado durante todo o processo de produção de qualquer material com audiodescrição. Somos, acima de tudo, valorizados enquanto consumidores e espectadores.

 

Toda a sensibilidade, talento e capacidade criativa dos alunos são empregados no sentido de produzir audiodescrição de qualidade. A busca pela excelência e pelo aprimoramento são constantes.

 

E como consumidores, queremos e merecemos material de primeira linha. Não vamos nos contentar com qualquer coisa que leve o rótulo de “inclusiva” sem atentar à sua qualidade.

 

Não queremos pessoas prestando uma “boa ação”. Queremos profissionais competentes que saibam fazer audiodescrição empregando toda a técnica e o talento a fim de igualar o acesso a cultura por pessoas com e sem deficiência visual.

 

Espero que cada vez mais as pessoas passem a entender e a compreender o sentido e a importância da acessibilidade e da audiodescrição da forma como a Letícia entende.

 

Pena e caridade, não. Profissionalismo e busca pela excelência constante, sim.