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Profissionalismo sim, caridade não

Ao comentar com uma pessoa conhecida sobre o curso de audiodescrição em ambientes culturais que estou fazendo na UFRGS, fui interpelada com o questionamento se a atividade tinha algum convênio ou relação com uma instituição social.

 

Respondi que não e perguntei: “Por quê? Deveria ter algum convênio?”. E a pessoa respondeu: “É que geralmente essas coisas têm um cunho social e são ligadas a alguma ação filantrópica”.

 

Melhor nem perguntar o que a pessoa quis dizer com “essas coisas” para não me incomodar, pensei. Mas essa situação não saiu da minha cabeça desde então.

 

Fiquei pensando o quanto qualquer ação em prol da acessibilidade ainda está ligada no imaginário das pessoas a uma obra social e até a caridade.

 

Acessibilidade ainda não é encarada como uma obrigação, um dever e uma responsabilidade de todos.

 

O que mais me chama atenção no curso, no qual tenho o privilégio de ser aluna da Letícia Schwartz, é o profissionalismo e a seriedade com que a audiodescrição vem sendo apresentada. A ministrante, em nenhum momento, se coloca em uma postura de benevolência, comiseração ou compaixão com os deficientes visuais.

 

Aliás, muito pelo contrário. O tema é tratado com o respeito e a seriedade merecidos.

 

Nesse curso, o deficiente visual não é entendido como alguém sem capacidade intelectual ou posicionamento crítico – como infelizmente ainda acontece nos dias de hoje.

 

O deficiente visual é ouvido e consultado durante todo o processo de produção de qualquer material com audiodescrição. Somos, acima de tudo, valorizados enquanto consumidores e espectadores.

 

Toda a sensibilidade, talento e capacidade criativa dos alunos são empregados no sentido de produzir audiodescrição de qualidade. A busca pela excelência e pelo aprimoramento são constantes.

 

E como consumidores, queremos e merecemos material de primeira linha. Não vamos nos contentar com qualquer coisa que leve o rótulo de “inclusiva” sem atentar à sua qualidade.

 

Não queremos pessoas prestando uma “boa ação”. Queremos profissionais competentes que saibam fazer audiodescrição empregando toda a técnica e o talento a fim de igualar o acesso a cultura por pessoas com e sem deficiência visual.

 

Espero que cada vez mais as pessoas passem a entender e a compreender o sentido e a importância da acessibilidade e da audiodescrição da forma como a Letícia entende.

 

Pena e caridade, não. Profissionalismo e busca pela excelência constante, sim.