Deficientes não consomem McDonalds?

No último final de semana eu e minha irmã viajamos para Buenos Aires. Compramos uma promoção num desses sites de compras coletivas e “simbora!!!”. Ficamos hospedadas no Hostel Colonial, onde fomos muito bem recebidas (recomendo!). O hostel fica bem no centro da cidade, próximo da Avenida Florida, da Galeria Pacifico e do Porto Madero. Nada mal!

Fui tratada muito bem em todos os lugares que visitamos, inclusive nos bares, cafés e restaurantes. A exceção ocorreu no último dia de viagem, quando resolvemos passear pela região dos outlets (para fazer umas comprinhas básicas e aproveitar as promoções, ehehehe). Depois de muito andar e olhar lojas, resolvemos parar no McDonalds para almoçar (quase três da tarde, com muita fome).

Até ai, tudo bem. Nunca fui a maior fã do McDonalds, mas, considerando que não queríamos gastar muito dinheiro nem parar por muito tempo (pois tínhamos que pegar o voo de volta para Porto Alegre depois), era a melhor opção.

Entrando lá, uma funcionária interpelou minha irmã e nossa amiga Cristina (uma pessoa bem querida que conhecemos no hostel) perguntando se elas queriam participar de uma pesquisa. Eles estavam pedindo a opinião dos clientes sobre dois novos sanduíches que seriam lançados. Seria preciso provar dois sanduíches, avaliá-los e escolher o melhor. Os participantes ganhariam o sanduíche escolhido de graça, junto com as batatas fritas e um refrigerante.

Elas disseram que estavam comigo (que aguardava na mesa, cuidando das sacolas pesadas com as nossas comprinhas!) e perguntaram se eu poderia participar também (para que fossemos todas juntas). A funcionária disse que sim, que não havia problema.

Então elas me chamaram e explicaram a proposta da pesquisa. Na hora aceitei participar. E ficamos rindo da situação. Afinal, éramos turistas muito econômicas – que viajam com cupom promocional da Internet, comem no McDonalds para economizar e, ainda por cima, iríamos ganhar o lanche de graça” hehehehe.

Até ai tudo bem. É… Se não fosse o que aconteceu em seguida. Esperamos uns 15 minutos numa fila para participar da tal pesquisa, pois so entravam quatro pessoas de cada vez na salinha para “provar” os dois sanduíches. Esperamos todo esse tempo na fila e, quando finalmente entramos na sala e eu já estava inclusive sentada na mesinha para provar os sanduíches, recebi a “brilhante” informação de que eu não poderia participar porque tinha deficiência visual.
Alegaram que era preciso avaliar os aspectos visuais do sanduíche e da embalagem. Dá para acreditar que não pude participar?

Tiraram então nós três da sala (eu, minha irmã e a Cris). Elas duas porque eram estrangeiras. Eu porque tinha baixa visão e era estrangeira. Que elas eram estrangeiras a funcionária já deveria ter notado quando falou com elas antes. Achei muito estranha essa desculpa. De qualquer forma, fiquei ofendida com o fato de que a deficiência visual era um impeditivo para participar daquela pesquisa de opinião sobre dois sanduíches.

Dá pra acreditar? Eu mesma ainda não acredito!

Eu não poderia participar de uma pesquisa de opinião como consumidora de sanduíches do McDonalds porque tinha deficiência visual? Teria que provar dois sanduíches e escolher o melhor. A minha deficiência não é gustativa, é visual apenas.

Entendo que eles estejam preocupados com a “estética” e aparência do produto, a caixinha, as cores etc. Mas as pessoas não entendem que, mesmo as pessoas cegas e com baixa visão, reparam na aparência das coisas e julgam os produtos que consomem sob sua própria ótica. Ou agora só porque o produto será vendido para um cego deve ser feio e mal apresentado?.

Alias, para avaliar o gosto, o cheiro e a apresentação de um sanduíche e de sua caixinha, acho que eu poderia avaliar tão bem quanto (se não até melhor) uma pessoa que enxergue normalmente.

Lembrei de todas as vezes que já comprei McDonalds desde a minha infância (quando comia aquele McLanche Feliz, que vinha com um brinquedo) até hoje. Quanto dinheiro já gastei com isso? Muito!!! E o que ganho em troca? NADA. Na hora de ser ouvida e considerada como cliente e consumidora sou ignorada.

Tudo bem que o enfoque na pesquisa não sejam as pessoas com deficiência visual, mas esse público faz parte dos consumidores que comem sanduíches e gastam dinheiro com isso (Ou agora vão me dizer que os cegos não comem? Não se alimentam com porcarias do McDonalds como qualquer pessoa?).

Como uma parcela importante da população as pessoas com deficiência precisam ser ouvidas – e se fazer escutar – como consumidoras. Lamentável esse acontecimento. Mas nunca esperei muita coisa do McDonalds em termos de qualidade.

Gostaria que os marketeiros desse estabelecimento reavaliassem suas estratégias preconceituosas de pesquisa de mercado e de propaganda. Tenho certeza que se todos os deficientes (mais de 20% da população) resolvessem fazer um boicote aos seus produtos eles iriam sentir o baque.

Estou falando de uma parcela bem representativa da população. Se não sou considerada como cliente, porque frequentar esse estabelecimento? Vou procurar outros locais em que a minha opinião seja valorizada.

Esse foi um percalço lastimável no final de minha viagem, mas o passeio em si em Buenos Aires foi fantástico. E é isso que importa. Se eu não comer mais MdDonalds durante toda minha vida minha saúde agradece. E estarei preparada para fazer mais e mais viagens, tendo uma saúde melhor e sempre uma bela disposição.

Que venham as próximas viagens! Qual será o próximo destino? Só espero não me deparar com novas pesquisas que eu não possa participar…

Novidades no Três Gotinhas

O Três Gotinhas agora tem uma página no Facebook! Curtam a página e a divulguem entre seus amigos! Outra novidade é que você pode cadastrar seu endereço de email e receber notificações sempre que o Três Gotinhas for atualizado! Essas duas novidades encontram-se na parte inferior do blog.

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Peça “Nossa vida não vale um Chevrolet” com audiodescrição

Na próxima sexta-feira (20 de abril), o espetáculo NOSSA VIDA NÃO VALE UM CHEVROLET terá sessão com audiodescrição. A ação é promovida pela Prefeitura Municipal de Porto Alegre/ SMC/ FUMPROARTE. Este é o primeiro de cinco projetos já selecionados pelo FUMPROARTE que contarão com acessibilidade para pessoas com deficiência visual.

NOSSA VIDA NÃO VALE UM CHEVROLET conta a saga de uma família de ladrões de carros, que vive à margem da sociedade e tem seu destino ainda mais desestruturado após a morte do patriarca. A situação se torna pior com o envolvimento dos três irmãos com uma mesma mulher.

Ao final da apresentação haverá um bate-papo com o elenco da peça.

Quer uma amostra? Confira a descrição de uma cena do espetáculo:

“O fogo ainda crepita dentro da lata de tinta. Na penumbra, Monk bebe da garrafa de bolso. Joga a cabeça para trás e ergue a garrafa, despejando a bebida para dentro da boca. Cambaleia. Bebe mais. Deixa-se cair sentado no chão. Deita.

Sílvia chega caminhando devagar. Detém-se ao se deparar com Monk. Avança até ele, que, ao percebê-la, ergue o corpo lentamente até sentar. Monk passa as mãos pelas pernas de Sílvia. Roça o rosto em suas coxas, enquanto ela afaga os cabelos dele. Sílvia se agacha e acaricia o rosto de Monk. Ele baixa a cabeça. Ela o segura pelo queixo e aproxima seus lábios dos dele. Beijam-se longamente. Ele volta a baixar a cabeça. Ela mostra um molho de chaves. Segurando-o pelo braço, Sílvia ajuda Monk a se levantar. Ele guarda a garrafa no bolso do macacão, passa o braço sobre os ombros dela e caminha com dificuldade até o ambiente da cortina de franjas. Sílvia ajuda Monk a sentar sobre a caixa de som. Deixa a bolsa e as chaves no chão. Monk bebe.”

INFORMAÇÕES GERAIS:

Sessão com audiodescrição de Nossa Vida Não Vale Um Chevrolet (espetáculo de teatro adulto)

Quando? dia 20 de abril, às 20 horas. A transmissão da audiodescrição terá início às 19:45. O evento termina em torno das 21:40.

Onde? no Centro Cenotécnico, na Rua Voluntários da Pátria, 1370.

Como chegar? O Centro Cenotécnico fica entre a Rua Garibaldi e a Rua Ramiro Barcelos. A tarifa de taxi, partindo do Mercado Público, fica em torno de R$ 10,00.

Quanto? entrada franca para pessoas com deficiência visual, mediante reserva antecipada.

ATENÇÃO: São apenas 40 lugares. Reserve seu ingresso com antecedência pelo e-mail milpalavras@milpalavras.net.br ou pelo telefone (51) 9993-5292.

NOSSA VIDA NÃO VALE UM CHEVROLET

Texto de Mário Bortolotto e direção de Adriane Mottola. No elenco, Rafael Guerra, Cassiano Ranzolin, Morgana Kretzmann, Fernanda Petit, Carlos Azevedo, Guilherme Zanella, Plinio Marcos Rodrigues e Eduardo Cardoso. Produção: MeK Produções Artísticas

Audiodescrição: Mil Palavras

Apoio: CEAPP – Centro Especializado de Apoio Pedagógico e Produção

Financiamento: FUMPROARTE – Prefeitura Municipal de Porto Alegre/ SMC

Documentário “Olhares”

O documentário Olhares (2012), dirigido por mim e por meu amigo Felipe Mianes, será exibido no dia 16 de maio no II Seminário Nacional de Acessibilidade, que ocorre na UFRGS. “Olhares” trata do acesso à cultura por pessoas com deficiência visual. Entrevistamos pessoas cegas e com baixa visão que contam sua experiências e sua relação com a cultura (teatro, cinema, música, literatura, museus, escola, restaurantes etc).

Quero convidar a todos para participar do Seminário, que conta com uma ampla programação. A exibição de “Olhares” será seguida por um debate entre o público e seus diretores acerca dos temas tratados no filme.

A realização desse documentário foi um trabalho extenso, que eu e o Felipe realizamos ao longo de todo o ano passado e início desse ano.

E como não poderia deixar de ser: “Olhares” terá audiodescrição!

Abaixo o link para inscrição e a programação completa do Seminário:

http://acessibilidadecultural.wordpress.com/2012/03/30/programacao-do-ii-senaac/