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Seminário discute acessibilidade em concursos públicos

Após tantos problemas no último concurso público que realizei para a Secretaria de Saúde do RS hoje recebi a notícia de que a Secretaria de Justiça e Direitos Humanos do RS realizará na próxima semana um seminário para discutir a acessibilidade nos concursos do Estado. Estarei lá como uma das painelistas. O evento é aberto ao público.
Considero imensamente importante a presença de outras pessoas com deficiência, que também vem passando por todo tipo de constrangimentos e dificuldades no acesso e realização de provas em concursos.

Será um momento impar para discussão e encaminhamento de medidas concretas já para os próximos concursos. Conto com o apoio dos leitores do Três Gotinhas replicando essa postagem e ajudando a divulgar o evento. Temos que aproveitar essa oportunidade e nos fazermos ouvir! Segue abaixo toda a programação.

O que: Seminário “A Acessibilidade nos Concursos Públicos Estaduais”

Data: 26 de fevereiro de 2014 (quarta-feira)

Horário: 14 horas

Local: Auditório do PROCON (Rua Sete de Setembro, 723, 4º andar – Centro – Porto Alegre/ RS)

Realização: Secretaria da Justiça e dos Direitos Humanos

PROGRAMAÇÃO

– 14 horas –
Mesa de Abertura:
Fabiano Pereira, Secretário de Estado da Justiça e dos Direitos Humanos; Representante da SARH; Roger Prestes, vice-presidente do COEPEDE

– 14:30 horas –
Palestra “Pessoas com Deficiência e o Direito ao Concurso Público” com o Dr. Fernando André Sampaio Cabral – Auditor Fiscal da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego de Recife, PE – Coordenador Estadual do projeto de inclusão de pessoas com deficiência e reabilitados da Previdência Social no mercado de trabalho

– 15:30 –
Painel: O acesso das pessoas com deficiência aos concursos e cargos públicos no Rio Grande do Sul

Coordenação: Adilso Corlassoli, assessor de Políticas para Pessoas com Deficiência da SJDH

Painelistas: Mariana Baierle, Jornalista, Mestre em Letras, apresentadora do Programa Cidadania da TVE e blogueira; Dr. Jorge Luis Terra da Silva, Procurador do Estado; Marli Conzatti, Diretora Presidenta da FADERS; Representante da SARH; Representante da FDRH; Dra. Ana Maria Machado da Costa, Auditora Fiscal da SRTE/MTE, Coordenadora do projeto de inclusão das pessoas com deficiência no trabalho;

A falta de acessibilidade em concursos públicos: encaminhamentos e repercussões

Para começar gostaria de agradecer as diversas mensagens de apoio, solidariedade e indignação que recebi de leitores do Três Gotinhas essa semana em função de todos os absurdos que ocorreram comigo no concurso para a Secretária da Saúde do RS no último domingo. Foram inúmeros comentários no blog, facebook, email e pessoalmente.

Quero que saibam que estou levando essa história adiante, pois não podemos tolerar mais esse tipo de acontecimento. Tanto se fala em acessibilidade e inclusão, o tema virou “moda” nos últimos anos, mas pouco se faz de verdade.

Mais lamentável ainda é saber que todos esses problemas ocorreram em uma prova para a Secretaria Estadual da SAÚDE, que deveria da ro exemplo aows demais órgãos e não tratar questões de acessibilidade como secundárias ou nulas.

Em primeiro lugar enviei por email para Fundatec (banca que realizou o concurso da Secretaria da Saúde do RS), através do link “Fale com o Presidente”, um relato de tudo que ocorreu comigo no dia da prova. Adivinhem se recebi alguma resposta? Certamente não. É mais fácil calar-se diante disso tudo do que tentar inventar qualquer justificativa plausível.

O texto que publiquei no blog (intitulado “Cotas para enjambração! Até quando?”) teve uma ampla repercussão. Através do apoio do amigo e ativista Felipe Mianes, a postagem foi parar na ONCB (Organização Nacional dos Cegos do Brasil) e na Secretaria Nacional dos Direitos Humanos, em Brasília, nas figuras do Moisés Bauer e do Beto Pereira.

Aqui em Porto Alegre, estive pessoalmente no Ministério Público, onde fui orientada para registrar o ocorrido junto à Promotoria de Justiça e Direitos Humanos. E foi o que fiz. Me informaram que a partir da próxima semana posso verificar quem é o promotor de justiça que estará cuidando do caso. Mas, ao perguntar por prazos ou próximos encaminhamentos, não souberam me responder, apenas disseram “que demora bastante”. (Desanimador!)

Registrei, ainda, o caso juntamente À Secretaria regional do Trabalho e Emprego, no Núcleo de Igualdade no Trabalho. Eles informaram que tomariam as medidas que tivessem ao seu alcance.

Além disso, estive, na última quarta-feira (29/01/2014), em uma audiência com o secretário de Justiça e Direitos Humanos do Rio Grande do Sul Fabiano Pereira e com a diretora de Direitos Humanos Tâmara Biolo Soares. Na ocasião, falei sobre as inúmeras dificuldades que tive nesse concurso em específico e lhes entreguei em mãos uma cópia impressa do relato que está publicado aqui no blog Três Gotinhas.

Expliquei que eu não estava lá apenas por esse concurso em si e por tudo que tinha ocorrido comigo, mas sim por uma causa maior e por todos os concursos que virão pela frente – para mim ou outras pessoas com deficiência. Essa não é apenas uma demanda minha, mas de milhares de indivíduos que não conseguem ter seus direitos assegurados sequer em um concurso público que possui vagas reservadas para pessoas com deficiência.

Citei ao secretário diversos casos para ilustrar melhor essa realidade. O primeiro foi o de um amigo com deficiência visual que foi considerado “inapto” para o cargo de professor do Estado no momento da perícia médica (mesmo tendo passado em primeiro lugar e tendo qualificação superior à maioria dos demais candidatos – inclusive hoje ele cursa doutorado fora do pais), E eu me pergunto: Quem é inapto nesse caso, o candidato ou o concurso?

Outros casos indignantes são o de candidatos que tiveram o pedido de prova em braile negado. Ou o de candidatos cadeirantes que são colocados para fazer provas em prédios sem nenhuma acessibilidade, tendo que ser carregados em escadas, inclusive correndo risco de quedas e lesões graves.

No caso dos candidatos com deficiência visual, as bancas ainda insistem em providenciar apenas uma pessoa para ler a prova – negando-se a providenciar a prova ampliada (do tamanho solicitado) ou em braile. Isso porque é mais “fácil” para eles fazerem isso e fingirem que dão acessibilidade.

O candidato precisa se submeter a escutar todas as questões, lidas em voz alta por pessoas muitas vezes despreparadas para isso. Fazer uma prova de português nessas condições, por exemplo, é horrível, pois não sabemos onde começa e termina um parágrafo. Geralmente a pessoa que lê não faz a pontuação correta, eliminando pontos e vírgulas, o que prejudica a interpretação do texto e, consequentemente, o desempenho do candidato na prova.

Eu poderia seguir citando outros tantos casos, mas esses já são bastante representativos.

Fazer um concurso público para uma pessoa com deficiência hoje é sinônimo de estresse e ansiedade. Isso porque não sabemos que tipo de percalço teremos pela frente. Ao invés de poder me focar em estudar para a prova e no conteúdo em si, a preocupação caba sendo anterior. Como será o dia da prova? Terei minhas demandas atendidas? Terei minha prova ampliada? Do tamanho certo que eu pedi ou será aquela “enjambração” de sempre?

Quero poder me inscrever em qualquer concurso e ficar tranqui8la, me preocupando – como todas as outras pessoas que prestam concursos – apenas com o conteúdo que vai cair na prova. Quero me inscrever para qualquer concurso e ficar relaxada, certa de que terei minhas demandas atendidas e meus direitos respeitados.

Infelizmente, a acessibilidade em concursos ainda é uma enjambração completa. Eu e muitas outras pessoas estamos tendo coragem de denunciar tudo isso. Mas penso também naqueles que sequer chegam saor de casa e prestar provas por já terem sofrido essas dificuldades ou saberem que inevitavelmente irão passar por isso também. (Até quando?!)

No fim das contas a reunião com o secretário de Justiça e Direitos Jumanos do RS Fabiano e a diretora Tamara Biolo Soares terminou com o comprimetimento deles de abertura de uma audiência pública sobre acessibilidade em concursos públicos. Aproveito a oportunidade para mobilizar outras pessoas que tenham enfretado dificuldades de acessibilidade em concursos a compartilharem suas experiências. (O Três Gotinhas estará sempre aberto a publicar relatos de leitores. Aguardo participações!)

Além disso, eles se comprometeram a enviar oficialmente meu registro à secretaria de Saúde do Estado Sandra Fagundes para que ela tome ciência das irregularidades desse concurso. Afinal, a Secretaria da Saúde contratou a Fundatec para executar a prova, mas é também responsável pelo concurso.

Enviei ainda esse relato para o Adilso Corlassoli, que é assessor de Políticas Públicas para Pessoas com Deficiência e está engajado na melhoria das condições de acessibilidade em concursos públicos. Aproveito para agradecer o apoio dos amigos Silvia Manique e Rafael Giguer, que também estão engajados na questão e contribuindo significativamente para dar visibilidade e encaminhamento a tudo isso.

Espero que todo o meu esforço não seja em vão. Vamos ficar no aguardo dessa audiência pública. Vamos ficar no aguardo do posicionamento do Ministério Público. Algo precisa acontecer (não apenas nesse concurso, mas para que não ocorra nos próximos).

Sobre acessibilidade na rede hoteleira

No início de dezembro estive em Curitiba pude vivenciar, na prática, o despreparo de uma grande rede de hoteis no que diz respeito à acessibilidade e ao atendimento de um cliente com baixa visão (no caso, eu mesma! Ehehe). Fiquei hospedada no hotel Ibis Budget, na rua Mariano Torres.

A pessoa que fez reserva para mim, pensando em facilitar minha orientação no hotel, havia feito um único pedido ao efetuar minha reserva: que meu quarto fosse o mais perto possível do elevador, pois seria mais fácil de entrar e sair do quarto. Ela avisou que eu tinha deficiência visual e que isso poderia facilitar o deslocamento. Um pedido simples que o hotel disse que poderia atender sem problemas.

Ao chegar no hotel na primeira noite, qual foi minha surpresa? Meu quarto era o último no final do corredor, o mais distante possível do elevador! E, ainda por cima, era um quarto para cadeirante. Fiquei perplexa com a situação, pois fizeram exatamente o oposto do que tinha sido pedido: me colocaram no último quarto no final do corredor e eu não havia pedido um quarto para cadeirante. Afinal, minha deficiência é visual e não motora.

Eis uma grande confusão que as pessoas fazem com relação a quem tem alguma deficiência. Já presenciei algumas pessoas falando alto comigo ou gritando (como se eu fosse surda), o que chega a ser hilário porque se tem algo que eu tenho muito apurado é a audição!

Até mesmo nos aeroportos quando viajo sozinha alguns funcionários de companhias aéreas já me ofereceram cadeira de rodas. Ora, se eu estivesse precisando de uma cadeira de rodas não teria problema nenhum em aceitar, mas não é o meu caso no momento. Acho que as pessoas pensam que por você não enxergar bem seria mais fácil ser empurrado em uma cadeira. Esses são alguns exemplos das confusões que somos submetidos constantemente.

Voltando ao que aconteceu no hotel em Curitiba, acabei ficando naquele quarto para cadeirantes no final do carredor e longe do elevador. O fato dele ter um banheiro grande, com barras de apoio e mais espaço para cadeira de rodas não me atrapalharia em nada. O problema, sim, era o fato de que aquele quarto tinha uma qualidade bem inferior aos demais. Já havia me hospedado nessa mesma rede Ibis várias vezes. Os quartos são iguais em qualquer lugar do mundo. Ou eram, até então, pois aquele quarto para cadeirantes parecia um porão. Tinha móveis bem mais velhos, com aspecto de mau cuidados e um banheiro antigo. Não tinha sequer papel higiênico no banheiro. Parecia todo mal cuidado e meio improvisado. Um desrespeito para qualquer hospede, independentemente de ser cadeirante ou não.

De qualquer forma, me ambientei no quarto e decidi que ficaria ali mesmo para evitar confusões, pois tudo que eu queria era participar do Seminário do Projeto Ver com as Mãos, conhecer a cidade e as pessoas. Iria passar o mínimo de tempo dentro do quarto do hotel. Enfim, no dia seguinte antes de sair fui deixar o cartão (que funciona como chave do quarto e senha para o elevador – mais detalhes sobre isso logo adiante) na recepção.

Para minha surpresa, o atendente verificou o número do meu quarto e me perguntou se eu iria mudar de quarto naquele momento. Respondi que eu estava em um quarto para cadeirante que não havia solicitado, mas que não iria mudar porque já estava instalada lá e estava de saída para um evento. O atendente disse então que seria “importante” eu mudar de quarto porque iria chegar um cadeirante ao meio-dia. E o hotel só tinha dois quartos para cadeirante, sendo que um já estava ocupado por um cadeirante e o outro por mim!

Falou isso como se eu fosse a culpada por estar no quarto para cadeirantes e por eles não terem mais quartos adaptados. Perguntei, já um pouco estressada, afinal, por que tinham me colocado naquele quarto? E ele não soube me explicar. Ficamos num impasse durante alguns minutos, pois eram sete e meia da manhã, eu tinha que ir para o meu evento e só voltaria para o hotel de noite. Já estava quase atrasada para sair, não teria tempo hábil de subir e mudar minhas coisas de quarto.

O atendente insistiu para que eu fizesse isso, pois o cadeirante chegaria ao meio-dia e eu só voltaria para o hotel de noite. Aquela situação toda era bem absurda. Pois eu estava em um quarto que não havia solicitado. O cadeirante iria chegar ao meio-dia e o hotel, que tem mais de 200 quartos, so tinha dois quartos acessíveis. Se eu não trocasse de quarto essa pessoa não teria onde ficar. Contudo, a culpa dessa confusão toda não era minha, mas eu estava sendo prejudicada.

O atendente se ofereceu para, ele próprio, trocar minhas coisas de quarto. Na hora me senti bem constrangida e até invadida, pois um cara que eu nem conheço teria que ir ao meu quarto, fechar minha mala, guardar as coisas que estivessem espalhadas, pegar meus shampoos no banheiro, escova de dentes, tudo!

Na hora relembrei mentalmente como havia deixado as coisas no quarto e, por sorte, sou bastante organizada. Não havia nenhuma calcinha ou sutiã fora da mala nem qualquer outra coisa que não quisesse que ele visse. Resolvi aceitar que eles trocassem minhas coisas de quarto – única e exclusivamente em consideração ao cadeirante que iria chegar. E se eu não fizesse isso o cara ficaria sem quarto.

De qualquer forma, foi uma situação bem chata. Sai de lá pensando em como seria feita aquela troca das minhas coisas. Disse para ele que colocassem as coisas exatamente no mesmo lugar que estava e que levassem as roupas que estavam penduradas no cabide sem amassar. Passei boa parte do dia preocupada com as minhas coisas no hotel! Avisei que quando chegasse iria conferir tudo. E foi o que fiz de noite.

Por sorte, sim, estava tudo no lugar, não estava faltando nada e a troca foi feita aparentemente com bastante cuidado – era o mínimo que podia fazer após todo auqele cosntragimento. E o quarto que não era para cadeirante tem uma qualidade e uma apresentação infinitamente melhor do que quele – o que é outro absurdo! A pessoa cadeirante paga o mesmo valor pela diária e merece um quarto tão bom quanto ao demais.

Mas os problemas e dificuldades nesse hotel não param por ai…

BRINCANDO DE GINCANA NO ELEVADOR

Como comentei anteriormente, recebi um cartão magnético que funciona como chave do quarto e também cartão para acionar o elevador. Sem o cartão não é possível ir até o andar do seu quarto.

Contudo, o uso do cartão não é nem um pouco simples para quem tem deficiência visual. Ele precisa ser inserido no elevador na posição correta, sendo que não há nenhuma identificação tátil, sendo igual dos dois lados.

Ainda por cima, não são apenas dois lados para serem testados. Há a opção “para cima” e “para baixo” em cada um dos lados. Ou seja, são quatro “chances” para você conseguir acertar a posição correta do cartão. Além disso, você precisa colocar o cartão, ver quando ligou uma lusinha super fraca e então tirar rapidamente o vcartão para que o elevador vá até o andar correto.

Nossa, uma verdadeira gincana de acerto e erro dentro do elevador. Sem contar que havia apenas um elevador funcionando naquele hotel com mais de onze andares. As filas eram enormes e havia essa dificuldade enorme com o uso do cartão.

E a dificuldade não era apenas minha, mas de outros hóspedes também. De vez em quando algum alguém era prestativo e me ajudava, mas em geral eu ficava tentando até acertar a posição e a velocidade da lusinha acender e apagar para eu retirar o cartão.

Falei sobre isso com os funcionários na recepção. Eles disseram que era por segurança. É claro que eu entendo, mas poderia haver uma forma mais acessível de garantir a segurança. Não adiantada o elevador ter botões em braille se tinha toda uma “gincana” para ser feita para conseguir ir até o meu andar!

O CAFÉ DA MANHÃ

No café da manhã não havia nenhum funcionário na porta para quem eu pudesse pedir ajuda. Minha maior dificuldade é identificar o que é cada coisa no buffet (motivo pelo qual, aliás,sempre evitei os buffets). O café do hotel era grande, cheio de coisas, sem nenhuma plaquinha identificando em fontes grandes o que é cada coisa.

No primeiro dia pedi ajuda na recepção e mandaram uma pessoa que estava na cozinha do café para me ajudar. No outro dia uma pessoa da própria recepção foi até o café comigo para me dizer o que eram as coisas.

Acho muito estranho que não tenha nenhum funcionário na hora do café, pois outras pessoas podem rpecisar de algum auxílio e simplesmente não aparece ninguém!

AS BARREIRAS PARA ORGANIZAR FILA NA RECEPÇÃO

Além de tudo que já contei, ainda tive que ficar desviando de barreiras para organizar filas na recepção. Aqueles postes baixinhos com uma fita aérea, na altura da cintura, são verdadeiras armadilhas para quem tem baixa visão, principalmente problema de campo visual como eu. Você olha pra frente e não vê nada. Ao andar, cai por cima daquele negócio baixinho no meio do caminho. A bengala também não identifica, pois as fitas ficam suspensas e apenas alguns postes fininhos tocam o chão.

Acabei derrubando no segundo dia um negócio naqueles. Algo bem chato, pois havia bastante movimento na recepção e todo mundo ficou prestando atenção em mim (a desastrada!).

O funcionário me disse para ficar calma, que não tinha problema, juntou tudo do chão e colocou no mesmo lugar novamente. Durante os 4 dias que estive lá aquelas barreiras me atrapalhavam.

Alguns funcionários, por detrás do balcão da recepção ficavam me dizendo “mais para esquerda”, “mais para direita” quando eu ia passar, o que me deixava mais nervosa ainda. Não poderiam sair detrás do balcão e vir até mim, sem ficar gritando?

Bom, como vocês podem ver, foram apenas quatro dias e já identifiquei tantos e tantos problemas no hotel. De modo geral, minha viagem foi ótima e não deixo que coisas como essas me abalem. Mas conviver com o despreparo das pessoas e a falta de condiç~eos dos espaços constantemente é algo, no mínimo, irritante e desrespeitoso. É algo que temos que batalhar constantemente.

Citei aqui todos os detalhes do hotel e sua identificação, mas não quero que isso fique apenas em relato em tom de crítica. Quero que os gestores dessa rede hoteleira leiam isso e possam refletir sobre como podem aprimorar seu atendimento e a estrutura física do hotel. Acho que falta treinamento e capacitação aos funcionários, além de uma consultoria por pessoas com diferentes deficiências, que poderiam apontar as dificuldades e o que pode ser melhorado.

Espero que um dia – em breve – eu (ou outras pessoas) possa voltar a Curitiba, cidade que adorei e conquistei grandes amigos, ficar novamente nesse hotel e trazer aqui um relato diferente. Um relato de mudanças e melhorias. Às vésperas de Copa do Mundo e preocupação cada vez maior com a acessibilidade nos espaços essas mudanças são urgentes.

Acessibilidade está se formando nas séries iniciais

Essa semana estive em um evento histórico no Rio Grande do Sul – e talvez no Brasil – no que diz respeito à acessibilidade. Minha irmã Julia Baierle Soares se formou em Administração de Empresas na UFRGS. A formatura contou com audiodescrição e intérprete de Libras. Outras formaturas da UFRGS já haviam contado com intérprete de Libras, mas foi a primeira vez que um evento como esse foi audiodescrito no Estado.

Preciso registrar aqui que as audiodescritoras da Tagarellas Audiodescrição Marcia Caspary e Mimi Aragon realizaram um trabalho fantástico. Posso dizer que foi a primeira vez que “vi” todos os detalhes da cerimônia. Geralmente essas solenidades são longas, com muitos discursos e também muitos elementos visuais, que para quem tem baixa visão como eu passam despercebidos, tornando o evento cansativo e entediante.

Dessa vez, porém, foi possível ter acesso a informações fundamentais como a entrega e a assinatura dos diplomas, a reação de cada formando, a forma de comemoração de cada um deles, as vibrações, as emoções da plateia, os sorrisos, os abraços, as lágrimas etc.

Marcia e Mimi, em um clima descontraído (mas com a seriedade e o profissionalismo de sempre) narraram aspectos visuais de toda a solenidade, desde o cenário, o ambiente do Salão de Atos, a distribuição das pessoas no palco, as cortinas, as cadeiras, a iluminação, os jogos de luz durante a cerimônia, os banners, os vídeos exibidos nos telões e as vestimentas dos formandos.

Foi tocante saber que alguns formandos iam receber os diplomas dançando ou sambando – o que pra mim foi uma grande surpresa, pois nunca consegui ver esses detalhes. Outros acenavam pra plateia. Alguns cumprimentavam toda a turma antes de receber o diploma. Outros davam um abraço coletivo nos colegas, formando um circulo e pulando. Fiquei emocionada quando Marcia narrou que um homem e uma moça deram um longo abraço, mas não um abraço qualquer, um abraço comovido e vibrante que balançavam o corpo todo.

Alguns formandos deixaram o capelo cair no chão na hora da foto. Sim, o “capelo”! Eis uma palavra nova que aprendi graças à AD. Capelo é o nome daquele chapéu dos formandos, que para mim não tinha nome ou chamava-se mesmo “chapéu de formatura” (ahahahha). Mais uma prova de como a AD amplia o vocabulário e a cultura das pessoas!

Outros formandos esqueciam de tirar a foto e tinham que voltar. Havia um funcionário no palco ajudando a arrumar os capelos na cabeça dos formandos na hora da foto. Além disso, a AD possibilite eu rir quando o capelo não encaixa na cabeça de uma formanda que está com um coque ou penteado diferente.

Foi emocionante em todos os aspectos. Me senti como em uma cerimônia de entrega do Oscar, com direito a informações sobre todos os detalhes e comentários sobre o significado daquela cerimônia. Foi emocionante para mim primeiro porque minha irmã estava se formando (aliás, ela também entrou fazendo dancinha no palco! Ehehehhe). Segundo porque eu sabia que aquele era um evento histórico, digno do meu maior respeito e admiração à UFRGS e à Tagarellas por proporcionar iniciativas como essa. Ao todo doze pessoas usaram fones de ouvido no evento, o que eu considero um número muito bom. Outras pessoas com deficiência visual além de mim também puderam compartilhar todas essas informações e emoções.

Tive a alegria de visitar as narradoras e amigas na cabine antes do evento começar. Elas disseram que eu estava linda com meu novo cabelo, que tinha cortado na altura do ombro especialmente para o evento! A emoção foi imensa.

Essa colação de grau me faz refletir que muitas coisas que eu imaginava que talvez levassem um século já estão ocorrendo agora. Tenho orgulho de vivenciar essas iniciativas. Tenho orgulho e satisfação em fazer parte dessa história e dessa mudança. Sei que essa foi apenas a primeira formatura audiodescrita no Estado. Sei que a acessibilidade ainda está longe de ser da forma como eu e tantas outras pessoas que sonham comigo gostaríamos.

Contudo, creio que os primeiros passos já foram dados. A semente está plantada. Algumas mudas já brotaram. Fazendo uma analogia ouso dizer que a Acessibilidade talvez esteja se formando, não na graduação, mas nas séries iniciais do Ensino Fundamental.

Talvez ainda demore para a Acessibilidade estar se formando na graduação, mestrado ou doutorado e estar presente por toda parte, sem precisarmos cobrar o tempo todo, sem precisarmos enaltecer cada vez que isso ocorre. Talvez ainda demore para isso ser algo corriqueiro e comum. Mas eu também imaginava que não veria filmes com audiodescrição no shopping e isso já vem acontecendo em Porto Alegre – de forma pontual, é verdade, mas o importante é que já ocorre.

O mais difícil – que é dar os primeiros passos – já aconteceu. Agora é preciso alargar os passos, seguir em frente para disseminar essa atitude por toda a parte e preparar as próximas formaturas!