Documentário Olhares está online

O documentário “Olhares” (2012) agora está disponível online para acesso em qualquer parte do mundo. No filme, pessoas cegas e com baixa visão contam suas experiências no acesso ao teatro, exposições, cinema, literatura, música e entretenimento.

A obra conta com audiodescrição – recurso de acessibilidade que permite acesso a pessoas com deficiência visual – e legendas – que se destinam ao público com deficiência auditiva. Trata-se de uma produção independente, produzida em caráter acadêmico e sem qualquer tipo de patrocínio. A direção, roteiro e produção são de Felipe Mianes (historiador e doutorando em Educação pela UFRGS) e Mariana Baierle (jornalista e mestre em Letras pela UFRGS) – ambos com deficiência visual.

Estima-se que “Olhares” já tenha sido assistido por mais de mil pessoas em eventos diversos, tais como: II Seminário Nacional de Acessibilidade em Ambientes Culturais na UFRGS, 6ª Primavera dos Museus (Salvador/BA), Mostra de Curtas-Metragem sobre a Temática de Deficiência da Fundação Liberato Salzano (Novo Hamburgo/RS), Feira do Livro de Novo Hamburgo/RS, Secretaria de Educação do Estado do RS, Santander Cultural (Porto Alegre/RS), Sala Redenção de Cinema Universitário da UFRGS, disciplinas da Faculdade de Educação da UFRGS, cursos de formação de professores e palestras na área da acessibilidade. Foi veiculado ainda na TVE-RS, canal de televisão aberta para todo o Rio Grande do Sul.

Segundo Mianes, o objetivo do trabalho é dar voz às pessoas com deficiência visual, destacando suas potencialidades na relação com o universo artístico e cultural. “Queremos mostrá-las como protagonistas de suas trajetórias de vida, para além dos estereótipos e das restrições”, afirma ele.

Desde os entrevistados até os diretores de Olhares tem diferentes graus de deficiência. Mariana Baierle comenta que ainda existe a ideia de que a pessoa com deficiência visual é apenas o cego. “No documentário buscamos dar espaço também aos indivíduos com baixa visão (aqueles com acuidade visual inferior a 30%), que possuem peculiaridades e representam a maioria entre o público com deficiência visual”, afirma ela.

É apenas de inclusão que precisamos? O que seria realmente a inclusão? O documentário convida à reflexão e ao debate sobre essas e outras questões trazidas no filme.

Para palestras, cursos, exibições públicas do filme ou consultoria em acessibilidade, entre em contato com os diretores através dos blogs: www.arteficienciavisual.blogspot.com ou www.tresgotinhas.com.br.

Para assistir “Olhares” acesse:

O preconceito velado no mercado de trabalho

A leitora Carlise Kronbauer enviou ao Três Gotinhas um depoimento sobre sua percepção quanto ao mercado de trabalho para pessoas com deficiência. Carlise é graduada em História e está concluindo Pós-Graduação em Pedagogia Empresarial e Educação Corporativa. Vale a pena conferir o texto dela!

“Observo todos os dias as vagas de trabalho reservadas a pessoas com deficiência nos sites da internet e, devido minha indignação, resolvi escrever. As empresas tem a visão que as pessoas com deficiência só podem trabalhar como auxiliar disso ou aquilo, não podendo ser analista, coordenador, gestor etc… Acompanho há meses a disponibilização de vagas de muitas empresas recrutadoras e as ofertas são sempre as mesmas – não condizentes com as pessoas com graduação ou qualificação mais avançada.

Acredito que nós, pessoas com deficiência, merecemos um trabalho mais digno do que as vagas ofertadas. Atualmente, estamos nos capacitando e qualificando para atingir níveis mais elevados de cargos. Muitos cegos, como eu, já possuem graduação e pós-graduação completa. Considero uma ofensa a oferta constante de cargos com salários miseráveis, que na conjuntura atual não conseguem suprir nossas necessidades básicas.

Dessa forma, gostaria que as empresas viabilizassem empregos condizentes com a formação do candidato e com realidade do mercado. É frequente as empresas recrutadoras culparem as próprias pessoas com deficiência por falta de qualificação, mas elas estão desinformadas sobre o currículo de muitos cegos por exemplo. É preciso que a visão das empresas se amplie para que possamos realmente vivenciar a inclusão, pois o mercado mudou. Estamos mais qualificados e competitivos do que no passado.

Enfim, desejamos um trabalho digno igual ao das pessoas sem deficiência. Os maiores cegos são aqueles que não enxergam que temos capacidade para atingir horizontes mais altos!”

(Carlise Kronbauer)

Caso você tenha alguma experiência para compartilhar com outros leitores, faça como a Carlise, envie pra mim: mariana.baierle@uol.com.br. Terei o maior prazer em publicar! Abraço a todos

Evoluindo com a Acessibilidade

Todos os conceitos dentro da ciência e da filosofia estão em constante evolução e aprimoramento. Na área da acessibilidade não poderia ser diferente. Esse foi um dos aspectos que ficou ainda mais evidente a partir do curso da professora Livia Motta, que esteve em Porto Alegre ministrando formação através do Programa Incluir da UFRGS.

Os encontros com a professora Livia evidenciaram o quanto os concursos públicos e provas de vestibular ainda precisam evoluir – e muito – em termos de acessibilidade para que candidatos com deficiência tenham condições de igualdade para sua realização.

A descrição correta, direta, objetiva e clara de uma imagem, por exemplo, pode ser fator determinante para classificar ou desclassificar um candidato. O acesso às tabelas, charges, gráficos ou imagens em qualquer prova é tão importante quanto acesso ao texto propriamente dito. Muitas questões não fazem sentido algum sem as imagens que as acompanham.

Atualmente, na maioria dos concursos e vestibulares, o candidato tem uma hora a mais para realizá-lo, contando com o auxílio de um ledor, que é também a pessoa que fará a descrição das imagens.

As descrições das imagens ficam, assim, a cargo desses ledores (alguns mais, outros menos preparados). Cada candidato com deficiência visual acaba recebendo uma descrição diferente (visto que esse é um atendimento individualizado). Ou seja, não existe uma descrição padronizada e igual para todos, pois é feita dentro do horário da prova sem um planejamento e revisão prévios. O ledor precisa ler todas as questões, preocupar-se com o ritmo de leitura, entonação e a imparcialidade da voz, além de descrever gráficos, imagens, tabelas e charges de forma objetiva e clara para o candidato.

Por mais que essa pessoa tenha boa vontade e seja preparada, trata-se de uma tarefa difícil e de grande responsabilidade. Certamente em algum quesito o candidato acaba prejudicado. Estamos falando em provas extensas, com muito conteúdo para leitura e com muito material visual para descrição.

Quem trabalha com audiodescrição e descrição de imagens estáticas, sabe o quanto não é tarefa simples descrever uma imagem – ainda mais ao vivo, sem acesso prévio às imagens da prova. É preciso técnica, estudo, preparo e muita prática para uma descrição de qualidade.

O que parece mais preocupante nisso tudo é que no momento em que cada candidato recebe uma descrição diferente, podemos supor que as condições de acesso não são exatamente iguais para todos. É evidente que a subjetividade de cada ledor pode interferir na qualidade e na precisão na descrição de cada imagem.

Nesse sentido, dentro do que foi discutido no curso, chegamos ao entendimento de que a prova de vestibular da UFRGS – ou de outras instituições – deveria vir com a descrição das imagens já pronta, de modo que o ledor precisasse apenas ler essa descrição, sem ter de construí-la improvisadamente no momento da prova.

Motivos como segurança e sigilo dos concursos, evidentemente, devem ser respeitados, mas jamais podem servir como impeditivo para que os candidatos tenham acesso ao conteúdo integral das questões.

O Princípio da Razoabilidade
Nessa mesma semana em que ocorreu o curso com a professora Livia Motta passei por uma situação tensa e constrangedora para conseguir realizar um concurso público. Desde o ato da inscrição, como de costume, enviei laudo médico indicando deficiência visual e solicitando que minha prova fosse realizada em fonte ampliada (Arial Black tamanho 22, pois é o tamanho que consigo ler).

Para minha surpresa, ao acompanhar o site do concurso para confirmar minha inscrição, verifiquei que eu teria prova com tamanho 15, muito inferior ao solicitado. Após inúmeras tentativas frustradas de ligações telefônicas e email enviado, a resposta foi a de que não seria possível fazer minha prova em tamanho 22 porque a “fonte padrão de ampliação é a 15”.

Expliquei que tamanho 15 praticamente não é uma ampliação, pois o tamanho comum de letra é 12. Ou seja, fonte 15 não resolve a questão. Mas as pessoas que me atendiam por telefone pareciam não entender sequer sobre o que eu estava falando. Uma delas chegou a dizer que eu não me preocupasse “porque é um tamanho 15 bem grande”.

Sem nenhuma solução para o caso, já no ultimo dia útil antes da prova, tive que ir pessoalmente até a sede da organização do concurso. Lá me mostraram um modelo de prova tamanho 15. Percebi então que a ampliação oferecida nada mais era do que um Xerox ampliado (ainda meio apagado) em tamanha A3.

A atendente insistiu que aquele era um tamanho grande. Expliquei que para quem tem menos de 10% de visão qualquer diferença – que para os outros parece mínima – para mim é muita coisa. A pessoa me disse ainda que, conforme constava no edital, as solicitações de adaptação de prova “devem seguir o Princípio da Razoabilidade e ficam a critério da banca realziadora”. Falou que eles faziam a fonte 15 porque era a maior que a gráfica tinha condições técnicas de fazer, que a prova não vinha de Porto Alegre, que era lacrada por medidas de segurança e sigilo.

Respirei fundo e respondi que imprimi uma prova em fonte 22 não era nada tão difícil ou fora do “Razoável”, basta marcar todo o texto no editor de texto e mandar imprimir. Não demora mais de dez minutos. Ela me disse que não era algo tão simples assim e que eu estava minimizando os fatos.

Percebi que o diálogo não adiantaria. Levava comigo uma notificação extrajudicial, na qual constava que eles teriam prazo de 24 horas para alterar no site o tamanho da fonte de 15 para 22. Solicitei que assinassem o recebimento. Caso o pedido não fosse contemplado, eu poderia entrar com um mandado de segurança que poderia levar à anulação do concurso. Eles assinaram a notificação e a partir daquele momento o tempo estava correndo.

Sai de lá tremendo e muito abatida, pois toda essa situação foi muito constrangedora e estressante. Sabia que eu precisava lutar por aquilo e que eu iria até o fim, pois estava buscando apenas um direito.

Essa não era uma agressão apenas contra mim individualmente, mas era algo muito maior. Era um desrespeito geral com todas as pessoas com deficiência. Eles não estariam me fazendo um “favor” ou me dando um “benefício” em fazer a prova ampliada, estariam simplesmente cumprindo a lei. Os concursos oferecem cotas, mas não querem dar as devidas condições sequer para a realização da prova. É inacreditável.

Eu não tinha estudado para aquela prova e era um cadastro reserva. Fiquei muito abalada e até sem vontade de fazer a prova. Queria simplesmente prestar o concurso despreocupadamente, sem passar por tanto estresse e complicações.

Felizmente no final daquele mesmo dia recebi um email dizendo: “excepcionalmente vamos atender seu pedido de fonte arial Black 22”. Felizmente não precisei entrar com nenhum mandado de segurança e o concurso aconteceu. Mas “excepcionalmente” não é “Razoável”. Eles precisam atender a todos os pedidos de fonte ampliada, não somente o meu, seja naquele concurso ou nos próximos que ocorrerem.

Dessa forma, percebo que as leis e os direitos garantindo acessibilidade existem, mas ainda é preciso muito esforço para que eles sejam cumpridos. Há garantia de acessibilidade nas provas do vestibular, mas será que isso ocorre da melhor forma? E no caso dos concursos públicos, como é possível a banca estipular o tamanho de fonte que o candidato com baixa visão consegue ler?

São situações como essas que me dão a certeza de que muito ainda temos que evoluir em termos de acessibilidade no nosso país. Não basta ter uma reserva de vagas se não forem dadas condições reais de acesso e permanência nesses espaços. Não basta haver uma rampa se o cadeirante não conseguir circular por ela com autonomia. Não basta ter descrição de imagens se não for bem feita. Não basta ter uma prova ampliada se não for do tamanho que a pessoa consiga ler. Não basta haver intérprete de Libras se ele não prestar um bom serviço. Não basta ter um elevador se ele não funcionar para todos.

No fim das contas, não passei no concurso, mas certamente aprendi muito sobre o “Princípio da Razoabilidade”. E espero que a organização do concurso também tenha aprendido (para que não cometa o mesmo equívoco com os próximos candidatos).

Enfim, nada de meia acessibilidade, é preciso acessibilidade por inteiro.

Projeto “Vivendo Histórias”eva literatura a idosos cegos

“Vivendo Histórias” é um projeto de extensão desenvolvido por alunos do curso de Biblioteconomia da UFRGS. Eles realizam contações de histórias para os moradores da Casa Lar do Cego Idoso, que fica no bairro Ruben Berta em Porto Alegre e abriga idosos que perderam a visão. São vovôs e vovós não teriam acesso à literatura se não fosse pelo trabalho voluntário dos estudantes. A maioria dos idosos perdeu a visão já com a idade adulta, ou seja, não foram alfabetizados no sistema braile.

Segundo a professora Eliane Moro, uma das coornadoras do projeto, o objetivo é trazer estímulo e desenvolvimento intelectual, moral e emocional aos idosos. O projeto acontece todos os sábados desde 2012. A professora salienta os laços de afeto que são criados. Os alunos são aguardados pelos moradores com muita expectativa durante toda a semana. São desenvolvidas atividades de contação de histórias, misturadas com elementos da música e do teatro.

Os gêneros mais pedidos são as lendas e os contos de fadas. Um dos idosos é apaixonado pelos contos de Machado de Assis. Então a cada encontro é trazido um contos diferente. Em alguns momentos ocorre inclusive uma troca de papeis, em que os idosos contam histórias aos estudantes – uma forma eficiente e descontraída de estimular a memória, a criatividade e o desenvolvimento social.

O projeto é uma atividade de extensão do curso de Biblioteconomia da UFRGS e os acadêmicos recebem créditos complementares pela participação. Estudantes de outras graduações da UFRGStambém podem participar.

Para mais informações sobre o Projeto escreva para o email vivendohistorias@yahoo.com.br./

Ou você pode entrar em contato diretamente com a Casa Lar do Cego Idoso (rua braille, 480, bairro Ruben Berta – Porto Alegre – fone 51 3340 6840). São mais de 40 idosos moradores da casa. A instituição precisa de doações de alimentos, principalmente leite, e também material de higiene pessoal. A ajuda de voluntários é sempre bem-vinda em todas as áreas.